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28/07/2010 - 14h36

Brasileiro "Incidente em Varginha" fez mais sucesso no exterior; leia entrevista

THÉO AZEVEDO
Da Redação

Divulgação

Cena da fase do metrô da Sé, de São Paulo, no game "Incidente em Varginha"

Cena da fase do metrô da Sé, de São Paulo, no game "Incidente em Varginha"

Em 1996, a suposta aparição e captura de um extraterrestre fez famosa a cidade de Varginha, na região sul de Minas Gerais. O caso, que ficou conhecido como Incidente em Varginha, ganhou ares de teoria da conspiração, já que as autoridades sempre negaram tudo. Marcos Fernandes Cuzziol e Odair Gaspar, que haviam aberto a Perceptum com a ideia de desenvolver jogos de temática nacional, enxergaram a oportunidade perfeita para colocar seu plano em prática.

"Incidente em Varginha" foi lançado em 1998 e ficou marcado como a primeira produção elaborada de um game no país. Na época, eram raras as iniciativas de desenvolvimento de jogos por aqui, e certamente nenhuma conseguiu tanto marketing, espontâneo ou não, quanto o shooter que mexeu com o imaginário em torno da misteriosa história dos extraterrestres.

Em uma época na qual "Half-Life" começava a dar as cartas no gênero de ação em primeira pessoa, "Incidente em Varginha" pode não ter causado grande impacto pela qualidade técnica, mas envolveu um detalhado trabalho de pesquisa e colocou o jogador em pleno centro de São Paulo e até na estação Sé do Metrô, diferenciais que chamaram a atenção da mídia e do público.

Porém, o game seria "vitimado" pelo mesmo problema que, anos depois, prejudicaria também a Continuum, com "Outlive": a distribuição. No Brasil, o esquema precário relegou o jogo a reles 2.000 cópias vendidas nas prateleiras, performance pelo menos dez vezes inferior à obtida no exterior, onde foi comercializado com nomes como "Alien Anarchy" e "Misión Alien".

A Perceptum ainda tentou produzir "Incidente em Varginha 2: Sombras da Verdade", cujos gráficos eram bem interessantes para a época, mas não conseguiu financiar o projeto. Hoje, a empresa ainda está aberta e faz pequenos projetos, mas seus sócios já se dedicam a outras profissões. Um deles, Marcos Cuzziol, concedeu a seguinte entrevista ao UOL Jogos:

UOL Jogos: "Incidente em Varginha" foi feito por uma equipe reduzida, utilizava um tema nacional, era ambientado em cidades brasileiras e concorria com pesos pesados do gênero. De onde, afinal, surgiu essa ideia maluca de desenvolver algo assim?

Marcos Cuzziol:
Mesmo antes de fundar a Perceptum, Odair [Gaspar, sócio de Cuzziol na Perceptum]e eu sempre achamos que existia algo muito importante na linguagem dos videogames, algo que ia além da mera diversão. O processo de produzir um videogame era bastante complexo (hoje, ainda mais) e queríamos dominá-lo por uma razão simples: produzir games com temática nacional. O desafio de desenvolver algo assim já seria suficiente para justificar o trabalho, mas parecia-nos importante também colocar um pouco de cultura brasileira numa linguagem nova e ainda pouco compreendida.

Veja abertura do jogo


UOL Jogos: Na época, você viajou para Varginha, conversou com moradores e tudo mais. Conte mais sobre esse trabalho de pesquisa.

Cuzziol:
Muito do que pode ser visto no game é resultado dessa pesquisa. As texturas de paredes, paisagens, sons etc, foram captadas nos locais reais. A música do nível "Praça da Sé", por exemplo, foi composta por Fábio Cardelli e executada com "samples" de sons característicos da praça: buzinas de automóveis, falas de camelôs, entre outros. Além da pesquisa sobre o caso, também estudamos a mitologia ufológica em geral, de modo que a história de fundo pudesse fazer sentido para quem conhece o assunto.

UOL Jogos: Eventualmente, outros títulos, dentre eles "Erinia", exploraram uma temática tupiniquim, mas há quem defenda que jogos assim não são comercialmente viáveis. O que você acha disso?

Cuzziol:
Acho difícil produzir um título comercialmente viável na primeira tentativa. Por isso ainda precisamos de muitas - a persistência é fundamental nesse campo. Tenho certeza de que há boa demanda para games com temática nacional. Talvez as pessoas simplesmente não tenham percebido isso ainda.

UOL Jogos: "Incidente em Varginha" chegou a ser lançado no exterior. Como foi a recepção do game em outros países?

Cuzziol:
De modo geral, a recepção foi muito boa. Por exemplo, lembro-me que o game foi bem comentado na Suécia e gerou listas de discussão pelas similaridades encontradas com os relatos reais. A reação mais surreal veio dei um contato por e-mail da central de treinamento das forças especiais americanas (afinal, eram essas mesmas forças que desempenhavam um papel de vilão no game!). A intenção era usar "Incidente em Varginha", em modo multiplayer e com missões específicas, para treinamento de soldados da força Delta. Expliquei que éramos uma empresa brasileira e indiquei a NovaLogic, que na época lançava o primeiro "Delta Force". Não demorou muito para saber do acordo entre a Novalogic e a central de treinamento das forças especiais americanas.

Por dentro de "Incidente em Varginha"
Crédito
Produtora: Perceptum (São Paulo/SP)
Lançamento: setembro de 1998
Tempo de produção: 2 anos e quatro meses
Equipe: 5 pessoas, além de terceirização do design de som e da engine
Nº de cópias vendidas: 2.000 (Brasil) e 20.000 (Europa, Ásia)
Distribuidora: Cia. do Software (Brasil) e Midas Interactive (Europa, Ásia e América do Sul)
O jogo: Shooter baseado na suposta aparição e captura de um extraterrestre na cidade mineira, com cenários ambientados no centro de São Paulo e na estação Sé do Metrô


UOL Jogos: Ironicamente, era difícil encontrar "Incidente em Varginha" à venda no Brasil. Por que?

Cuzziol:
Tivemos muitos problemas com a distribuição no Brasil. Muitos nos procuravam para dizer que não encontravam o produto em lugar algum. Para dar uma idéia, a versão pirata chegou a custar mais caro que a original. Tenho certeza de que a história da Perceptum seria bem diferente se houvéssemos conseguido um bom acordo de distribuição nacional naquela época.

UOL Jogos: Vocês receberam dos publishers todo o dinheiro ao qual tinham direito?

Cuzziol:
No exterior, sim. Isso nos deu algum fôlego para iniciar a seqüência do game (não foi o caso com outro game desenvolvido apenas para o mercado internacional, Scooter Challenge, que teve vendas surpreendentes na Europa - desse não vimos um centavo sequer).

UOL Jogos: "Incidente em Varginha 2" chegou a figurar na internet, com informações e imagens, e parecia muito interessante. Havia até o apoio da Intel, na época, por causa do Pentium. Por que o projeto não vingou?

Cuzziol:
Um demo de "Incidente em Varginha 2" foi selecionado pela Intel para apresentação no evento de pré-lançamento do processador Pentium III, em 1999, dentro do programa de desenvolvedores Intel. Mas as vendas do primeiro título no Brasil iam mal por conta de problemas com a distribuição. O dinheiro recebido do exterior nos ajudou bastante, mas não foi suficiente para que finalizássemos a sequência. O código estava pronto, mas o desenvolvimento de conteúdo ainda exigia recursos. A solução foi aceitar o convite do instituto Itaú Cultural e usar o que tínhamos pronto para "Incidente em Varginha 2" na exposição virtual "Imateriais 1999". Esse foi o início de uma relação que têm me mantido no instituto desde então.

UOL Jogos: O que houve com a Perceptum, desde então?

Cuzziol:
A Perceptum continua trabalhando. Foi preciso alterar a estratégia, é claro, mas eu e o Odair continuamos desenvolvendo games durante noites e finais de semana. Trabalhamos recentemente em dois projetos selecionados do BRGames 2009: "Mutualismo" e "Robô Sucata".

UOL Jogos: Hoje, ainda que a duras penas, o mercado de games no Brasil cresceu. Há cursos especializados, eventos para apresentar projetos a publishers, uma associação como a Abragames e por aí vai. E naquela época, como funcionava a "saga" de quem tinha uma ideia na cabeça e vontade de desenvolver jogos?

Cuzziol:
Era preciso pagar para ver, ser autodidata, descobrir como as coisas funcionavam em todas as etapas do processo. Para dizer a verdade, nunca pensamos em "fazer dinheiro" com games naquela época. A ideia principal era adquirir conhecimentos e dominar a linguagem. Hoje, apesar de todas as dificuldades, já é possível viver dessa profissão.

Divulgação
"Incidente em Varginha 2" começou a ser produzido, mas não foi finalizado


UOL Jogos: Se pudesse voltar no tempo, você faria "Incidente em Varginha" novamente?

Cuzziol:
Faria sim, sem dúvida. Trabalhar em um projeto como esse, do princípio ao fim, é uma experiência que não tem preço. Foi um período fantástico, que mudou significativamente minha vida. Para melhor.

UOL Jogos: Afinal de contas, o que você acha que aconteceu em Varginha?

Cuzziol:
Algo bastante incomum, para dizer o mínimo. Pode ser difícil acreditar, mas muito do que está no game reflete relatos reais. A presença de militares americanos, a movimentação nos dois hospitais da cidade, a base subterrânea em São Tomé das Letras, etc. Ao escrever o enredo do game, tentamos apenas costurar essas informações de maneira coerente. É uma visão sobre o que pode ter acontecido.

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