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Entrevista: Artista da série "God of War" deixa para trás megaproduções

Pedro Henrique Lutti Lippe

do Gamehall

23/10/2013 15h16

Com o crescimento da produção de jogos no formato mobile e o advento de uma nova geração de consoles de mesa, a indústria está mudando muito. Mas Cecil Kim, o principal responsável pela arte da série "God of War", não sabe dizer se para melhor ou pior.

No último domingo (20), em São Paulo, o premiado artista sul-coreano falou ao público da terceira edição do The Union, evento de computação gráfica, efeitos visuais e arte digital organizado pela escola SAGA em parceria com a californiana Gnomon School of Visual Effects. Em sua palestra, ele discutiu em detalhes a produção de arte para jogos de grande e pequeno porte.

Em entrevista ao UOL Jogos, Kim mencionou a dificuldade de trabalhar em megaproduções como "God of War III", pelo qual ele recebeu um prêmio BAFTA em 2011, e explicou o atual estado da produção de arte digital na indústria dos games. "Hoje em dia, o que mais importa para um artista é seu portifólio", garante.

  • Pedro Henrique Lutti Lippe/GameHall

    Público lotou o WTC Golden Hall para acompanhar a palestra de Cecil Kim no The Union

Artistas em ação

Apesar de ser formado pela em Ilustração pela Art Center College of Design, Cecil Kim garante que um diploma não é necessário para aqueles que desejam ingressar na indústria dos jogos como artistas. "Normalmente o que as empresas olham é o portifólio", afirma. "No fim das contas, ter ou não ter um diploma é apenas parte do processo de realização pessoal. Tenho um amigo artista que abandonou seu curso na metade e hoje faz parte da indústria. Ele diz que quer voltar e acabar, mas nunca o faz. E ele não precisa disso".

PRODUÇÃO DE UMA VIDA?

  • Ao longo de sua carreira, Cecil Kim só trabalhou em seis títulos. Pela Squaresoft, ele atuou em "Parasite Eve" e em "Final Fantasy IX". Depois, pela Sony Santa Monica, ele cuidou da arte dos jogos da série "God of War" para PS2 e PS3, tendo deixado o estúdio no meio da produção de "Ascension".

    "Às vezes eu páro pra pensar. Tenho mais de 40 anos e só lancei seis títulos. Preciso me preocupar com o legado que deixarei pra trás", admitiu Kim durante sua palestra no The Union, em tom de brincadeira.

Mas saber desenhar não é o suficiente. Kim afirma que novatos passam uma boa parte de seu tempo criando modelos tridimensionais, e que saber fazer isso é essencial para entrar nos grandes estúdios. "É importante ter a paixão por desenhar, mas só isso não basta", revela.

Mudando o foco para artistas com mais experiência na profissão, Kim discute um fenômeno interessante: a terceirização dos times de arte. De acordo com ele, as grandes produtoras estão seguindo uma tendência de exportarem o trabalho de arte para firmas externas. "Isso acontece porque os estúdios são muito preocupados com prazos curtos", afirma. "Um exemplo disso é a Naughty Dog, que tenta terceirizar o máximo possível da produção de arte cobrada por seus jogos".

O artista mencionou ainda o intercâmbio de talentos entre as indústrias de jogos e cinema. "Os artistas digitais que trabalham com cinema são poucos, e eles atuam sob um sindicato próprio. Não é raro que artistas que trabalharam com games passem para o cinema, já que as cobranças são bastante parecidas, mas é incomum ver o contrário acontecer", explica.

  • Mesmo tendo deixado o jogo no meio da produção, Kim deixou sua marca em "Ascension"

As dificuldades do ramo

Atualmente, Cecil Kim atua como diretor criativo da Section Studios, recém-fundada empresa que trabalha por contratos, criando trailers com efeitos especiais, e também desenvolvendo suas próprias IPs. O estúdio já lançou um jogo para iOS - "Igor's CoinQuest" - e está produzindo vários outros.

No futuro próximo, o maior destaque do catálogo será um jogo de luta bidimensional com gráficos simples que é fruto de uma parceria com a Scary Mostro, produtora independente de Francesco Gigliotti e Todd Alderman, os principais designers de "Titanfall".

"Chega um momento na vida em que você precisa se desafiar para continuar ativo", explica Kim ao ser questionado sobre a decisão de deixar a Sony Santa Monica, onde passou a maior parte de sua carreira. "Foi uma decisão difícil, mas foi uma que precisava ser feita. Eu gosto de ter controle sobre o que estou fazendo".

Ao tocar esse assunto, Kim ainda citou o que ele diz ser o maior problema de seu ramo: a cobrança pesada dos profissionais de arte durante os períodos de 'crunch', em que trabalha-se durante os fins de semana e com muitas horas extras diárias. "É muito difícil manter-se motivado quando você não tem tempo para ir para casa e jantar com sua família. É uma situação muito pesada, que é comum na produção de todos os grandes jogos", desabafa.

Mesmo antagonizando o conceito das grandes produções, Kim não tem uma opinião formada sobre o atual rumo da indústria - que tem cada vez mais espaço para pequenos games. "Eu acho que ainda é muito cedo para dizer se isso tudo é bom ou ruim, mesmo para mim como um artista", afirma.