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Escândalos mancham campeonatos profissionais de "Counter-Strike"

Rodrigo Guerra

Do UOL, em São Paulo

20/02/2015 10h00

O cenário competitivo de "Counter-Strike: Global Offensive" não é um dos mais populares, mas tem um público cativo e engajado. Porém, nos últimos meses temos acompanhado uma série de escândalos envolvendo jogadores e times importantes, o que acabou revelando uma faceta nada divertida do eSport.

Em agosto de 2014 um dos principais times norte-americanos, o iBUYPOWER (IBP), tinha uma partida fácil pela frente: derrotar o fraco, porém promissor, NetcodeGuides.com (NCG). Mas o resultado da partida foi vitória para a NCG, o que poderia ser encarado como algo normal, afinal, os 'azarões' também têm chances nos campeonatos.

Mas tinha algo estranho acontecendo. O IBP não rendia, estava desorganizado e alguns jogadores compravam equipamentos e não os usavam. E o que falar do mal posicionamento, a aparente falta de estratégia para tomar territórios e os riscos desnecessários? Essas atitudes não são normais em uma partida desse nível.

No vídeo logo abaixo (em inglês) é possível ver que até mesmo os narradores estavam se questionando sobre a estratégia adotada pela equipe iBUYPOWER. Eles apontam diversos erros técnicos que o time não costuma apresentar.

COMO FUNCIONAM AS APOSTAS?

Uma faca como essa custa até R$ 200 no mercado do Steam

Dentro do Steam existe uma parte dedicada para negociação de itens entre usuários da comunidade, o Workshop. Lá os jogadores podem vender ou trocar visuais para armas (skins), ícones de chat, papéis de parede entre muitos outros itens.

Como são materiais puramente cosméticos, esses itens não interferem com a habilidade do jogador. Algumas skins são extremamente raras, o que acaba aumentando seu valor no mercado do Steam.

É aí que entra o site de apostas. O interessado entra com sua conta do Steam para escolher os itens que quer apostar e, se você ganhar a aposta, vai receber as skins em sua caixa de entrada do Steam. Para ganhar o dinheiro, basta colocar a skin à venda no mercado do Steam e esperar um interessado para compra-la – e tem muita gente que paga pequenas fortunas por alguns visuais de armas do jogo.

A razão para isso é que o jogo foi arranjado. Segundo o The Daily Dot, os jogadores da IBP estavam jogando mal de propósito. Na reportagem, o site aponta que um dos jogadores apostou na derrota de seu time para ganhar skins bem caras – que por sua vez podem ser vendidas no mercado da comunidade do Steam. O valor arrecadado com essas apostas, segundo o Daily Dot, soma mais de US$ 10 mil.

Apostas são comuns nos campeonatos de "Counter-Strike". Existem até sites especializados para isso, contando inclusive com ferramentas oficiais da Valve, publicadora do jogo e dona da loja online Steam, para agilizar a troca de itens entre os apostadores (veja mais sobre isso no box ao lado).

A aposta pode não ter sido o único motivo para a IBP perder a partida. De acordo com um dos jogadores envolvidos, Shahzeb "ShahZam" Khan, a derrota foi arranjada por Sam "DaZeD" Marine, o capitão da IBP que também é coproprietário da Netcode Illuminati, empresa que é dona do time NetcodeGuides.com.

Esse arranjo, em teoria, iria facilitar a escalada do NCG durante a fase qualificatória da liga CEVO Professional, campeonato que tinha uma premiação de mais de US$ 100 mil para o melhor time. Por outro lado, a IBP não seria prejudicada com a derrota, pois já estava classificada para a próxima fase do campeonato.

Em sua defesa, o iBUYPOWER declarou em nota que a derrota não foi uma armação, mas sim resultado de cansaço (o time tinha acabado de fazer uma temporada no ESL One, campeonato que aconteceu em Colônia, Alemanha), e falta de treinamento no mapa em que a partida foi disputada.

VEJA COMO FOI A PARTIDA DO IBP CONTRA O NCG

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Trapaça não é brincadeira

Além do escândalo dos apostadores, o final de 2014 foi marcado por diversos jogadores profissionais pegos usando programas de trapaça em "Counter-Strike: Global Offensive".

Tudo começou com o jogador alemão Simon "smn" Beck que foi banido por usar ferramentas de trapaças em sua conta no Steam. Beck conseguiu usar um software que burlava as ferramentas de segurança da Valve usando programas de ajuda de mira e para ver através das paredes.

Segundo ele, esses programas foram usados apenas por diversão, nunca em partidas oficiais de campeonatos. Mesmo assim, a prática infringe o termo de uso dos jogos do Steam, e a Valve o retirou da cena competitiva.

Com isso, "smn" denunciou outros pro-players que usavam as mesmas ferramentas, incluindo Hovik “KQLY” Tovmassian, do time Titan, e Gordon “SF” Giry, do Epsilon - grandes nomes do cenário competitivo.

Quebrando a banca

Ainda é muito difícil provar que um time está perdendo de propósito, seja por apostas ou outros motivos, mas as primeiras ações já foram tomadas para evitar que esses casos se repitam.

A Valve rastreou as transações dos jogadores profissionais no mercado de apostas e descobriu diversas movimentações suspeitas. O resultado preliminar suspendeu sete jogadores profissionais, porém, mais tarde, mais 21 jogadores e 3 times caíram na malha fina. Todos foram banidos dos campeonatos patrocinados pela Valve – que geralmente são os eventos que têm os maiores prêmios em dinheiro.

No caso dos jogadores trapaceiros, diversos profissionais foram banidos por usar programas que davam vantagens. A coisa ficou tão feia para esses jogadores que foi até criado um site de monitoramento em tempo real para divulgar o nome de quem foi pego usando desses programas.

"Jogadores profissionais, diretores e membros do staff do time não podem, em circunstância alguma, apostar em partidas, se associar com grandes apostadores ou passar informações que possam influenciar em apostas de 'Counter-Strike: Global Offensive'", disse a empresa em comunicado oficial.

A Valve espera que após essas sanções o mercado de apostas dos jogos não influencie as partidas de campeonatos e espera que os pro-players adotem uma postura mais séria em relação à sua profissão e ao jogo.

"Em 2014 nós testemunhamos um crescimento explosivo de 'Counter-Strike: Global Offensive' como um eSport competitivo. Mas, com a expansão de 'CS:GO', é importante considerar o impacto substancial que um jogador profissional pode ter na saúde e estabilidade do esporte. Ao atuar na frente de uma audiência de milhões de jogadores, eles se tornam embaixadores do jogo – a força das partidas profissionais de 'Counter-Strike' vem da integridade dos seus jogadores e times", disse a Valve em nota no blog oficial do jogo.

Mas assim como qualquer esporte é necessário que a os organizadores fiquem em cima dos atletas e fiscalizem suas atitudes fora do jogo para que casos como esses não se repitam e não manchem - ainda mais - a reputação dessa categoria do eSport.