Em 2008, Renato Pessanha, analista de sistemas de Sorocaba (SP), encantou-se com o iPod e, aconselhado por um amigo, resolveu baixar o kit de desenvolvimento da Apple para "tentar produzir alguma coisa", conforme ele mesmo conta. Seu aplicativo mais bem-sucedido na AppStore é
"Forca Brasil", que já vendeu 20.000 cópias - o game sai por US$ 0,99 e o produtor fica com 70% do valor; faça as contas.
Pessanha é um dos produtores independentes que têm aproveitado - muito bem, por sinal - o modelo de "self-publishing" (algo como "publique-você-mesmo") da loja virtual da Apple. O analista de sistemas mostra uma queda por jogos com identidade nacional - além de "Forca Brasil", é também o autor de
"Truco Brasil",
"Palavras Cruzadas", dentre outros. Embora este apego tupiniquim restrinja o público-alvo, ele não se abala: "imagine comprar um iPhone e não ter nenhum aplicativo em seu idioma ou relacionado à sua cultura".
O modelo de negócios não é nada mal, já que o ciclo de desenvolvimento de um jogo para iPhone é bem menor que o de um game convencional. Felipe Oliveira, programador que mora nos Estados Unidos e fez títulos como
"Math Zombie", além do aplicativo "Sons Engraçados", não costuma gastar mais do que 30 dias para concluir suas criações. Às vezes, dá até para terceirizar funções: "No começo, eu trabalhava 100% sozinho (programação e visual), mas hoje em dia eu contrato designers para cuidar do visual dos jogos", explica.
Tanto
"Math Zombie" quanto "Sons Engraçados" venderam mais de 10 mil cópias desde o lançamento. Nada mal para o que Oliveira descreve como um "ótimo quebra-galho": "ganho, sim, um bom dinheiro com a AppStore, mas infelizmente ainda não é minha principal fonte de renda". Já Pessanha, em certos meses, chega a ganhar mais com a AppStore que com o trabalho como analista de sistemas: "Talvez se eu me dedicasse integral pudesse ganhar um bom dinheiro".
O custo, no final das contas, é pequeno, já que a licença para desenvolver e publicar na AppStore sai por US$ 99 anuais. Além disso, o desenvolvedor deve arcar com os custos de importação do dinheiro para o Brasil, sem falar nos impostos. "Com a AppStore, o desenvolvedor independente tem acesso a milhões de potenciais clientes de forma rápida e sem muitas complicações. Não tem a necessidade de se preocupar com processamento da venda, cobrança e distribuição do software", resume Oliveira.
Com visual caricato, "Karate Monkey" apresenta um símio lutador |
Produtoras experimentamPara as produtoras de games do Brasil, a ordem com o iPhone é experimentar. Ainda mais focadas na produção de títulos para consoles, celulares ou "advergames" (jogos com fins publicitários), a plataforma de Apple se mostra um terreno fértil para exercitar ideias. "Interessa-nos muito o potencial de integração dessas plataformas com ferramentas de mídia social, que dão possibilidades muito interessantes para serem exploradas com games", explica Winston Petty, diretor da Kidguru, que acaba de lançar o game
"Lumaki" para iPhone.
Assim como a Kidguru, a Webcore Games ainda não lucra com a AppStore.
"PaperCraft", primeiro título da empresa para iPhone, foi vendo a US$ 0,99 e se pagou. Como a empresa é focada em advergames, no entanto, a partir de então encontrou um jeito de transformar a plataforma em algo rentável: "os demais projetos geraram lucro porque foram pagos pelos anunciantes, ou seja, o jogo é gratuito para o usuário final", diz Fernando Chamis, diretor da empresa.
Como nem tudo são flores, Bruno Santos, produtor da Tectoy Digital, que já desenvolveu títulos como
"8 Segundos", alerta para a saturação de títulos na AppStore: "Há jogos demais, então é necessário encontrar alguma forma de destacar seu jogo na 'loja'".
A MusiGames, contudo, tem uma história diferente para contar: já amargou prejuízo com alguns jogos, até que acertou o passo e viu títulos musicais como
"Drums Challenge" e
"iMusic Puzzle" transformar o iPhone no principal investimento da companhia.
Em média, cada jogo da MusiGames para iPhone custa entre R$ 40 mil e R$ 80 mil para ser desenvolvido. O próximo passo, segundo Américo Amorim, diretor da empresa, é elevar o patamar de qualidade. O objetivo já está traçado: "Queremos sair do nível onde estamos (jogos entre os dez mais vendidos da sub-categoria jogos musicais) e entrar no top dez geral".
Já há dezenas de títulos desenvolvidos por brasileiros, independentes ou não, à venda na AppStore. A contagem, com iPad e iPhone 4 aumentando a base instalada, só tende a aumentar. É uma equação que agrada a todas as pontas - Apple, produtores e consumidores - e que deve servir de modelo para investidas em distribuição digital.