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13/04/2011 - 10h15

Além do Jogo: #videogamemata, #literaturamata, #cinemamata...

GUILHERME SOLARI
Colaboração para o UOL
Braço sensacionalista da mídia tenta implicar videogames em Realengo, mas barra na nova geração de leitores que cresceu com os games


Alguns jornalistas estão aprendendo do jeito difícil que não estão mais escrevendo só para anciões indignados, mas cada vez mais para pessoas que estão acostumadas com games - violentos ou não



A essas alturas todos estamos um pouco saturados com as informações e desinformações sobre o ataque que Wellington Menezes de Oliveira cometeu na Escola Municipal Tasso da Silveira, em Realengo, no Rio. Trata-se de um tema que ultrapassa em muito o escopo de um site de games como este, mas também de nosso interesse ao mostrar como parece cada vez mais jurássico quem tenta hoje sugerir o mesmo discurso "Columbine" de dez anos atrás sobre os games violentos.

Após um ataque como o de Realengo, a mídia passa a destrinchar meticulosamente o passado do agressor em busca de uma explicação - qualquer explicação - para alimentar o enorme interesse público. As principais explicações empacotadas e prontas para consumo que foram levantadas incluem fanatismo religioso, bullying, o referendo de desarmamento de 2005, psicopatia, a recente perda da mãe pelo atirador e, claro, os tais videogames "de tiro".

Dois pesos, duas medidas

Curioso como ninguém está interessado se Wellington apreciava longa-metragens violentos, já que diversos inspiraram crimes na vida real, como "Laranja Mecânica", "Assassinos por Natureza", "Taxi Driver" e "Robocop". Até filmes da série "Matrix" foram ligados a assassinatos, como em 2003 quando o norteamericano John Cooke achava que ele próprio vivia dentro da Matrix e atirou em duas pessoas com uma espingarda por acreditar que eles fossem os malignos agentes da saga estrelada por Keanu Reeves.

  • Divulgação

    Diversos obras da literatura e do cinema foram inspirações diretas para crimes na vida real, como "O Apanhador no Campo de Centeio"


A lista na literatura não é menos extensa. Venenos mencionados em romances policiais de Agatha Christie já foram usados como armas de crime, os discípulos de Charles Manson eram obcecados pela obra de ficção científica "Stranger in a Strange Land" e até o clássico de J. D. Salinger, "O Apanhador no Campo de Centeio", foi implicado. No episódio mais notório com o assassino de John Lennon, Mark David Chapman; que até assinava como se fosse o protagonista Holden Caulfield.

A reação dos internautas às matérias que ligam videogames com Realengo mostra como alguns jornalistas estão aprendendo do jeito difícil que eles não estão mais escrevendo para anciões que vêem os games como corruptores da juventude, mas cada vez mais para pessoas que cresceram jogando. Muitas reportagens com tais referências receberam comentários negativos, ou são retransmitidas pelas redes sociais em tom de chacota. Os amantes dos games não parecem mais se contentar em ficar na defensiva quando vêem seu hobby ligado gratuitamente a homicídios.

Reações

Sites como Kotaku, Gizmodo e Techtudo comentaram uma matéria do Globo do dia 9 de abril que apontava a relação entre games e o ataque; já que a polícia encontrou discussões de "Grand Theft Auto" e "Counter-Strike" nos e-mails de Wellington. Apontam inclusive como a reportagem trazia a afirmação errada, agora corrigida, de que "nos dois jogos, acumula mais pontos quem matar mulheres, crianças e idosos", o que já revela a extensão de conhecimento dos autores da matéria sobre o assunto. "É um misto de ingenuidade e má-fé, para dizer o mínimo," comentou sobre o episódio no site da Associação Comercial Industrial e Cultural de Games o Professor de Design de Games e Efeitos Especiais Kao Tokio. "Como se o próprio histórico de tragédias da vida do jovem não antecedessem o episódio, de acordo com informações veiculadas pela própria mídia".

A hashtag #videogamemata entrou na última segunda-feira nos trending topics do twitter e reuniu boa parte da reação contra o sensacionalismo tentando sugerir a influência de jogos eletrônicos nos eventos de Realengo. A hashtag satirizou a suposta falta de discernimento dos gamers em saber a diferença entre virtual e real com frases do tipo "Joguei tanto Metal Gear que me sinto o mestre da camuflagem quando me escondo dentro de uma caixa de papelão", "Joguei tanto RPG que quando meu filho nascer vou escolher skills pra ele" ou "Joguei tanto Super Mario World que aprendi que quando preciso de dinheiro é só bater com a cabeça em um tijolo".

  • Reprodução

    Lançado em 2005, "Super Columbine Massacre RPG!" satirizou o tratamento sensacionalista que a mídia deu ao caso, recebendo ao mesmo tempo duras críticas e a defesa por desenvolvedores


O massacre de Columbine cometido por Eric Harris e Dylan Klebold em 1999 talvez tenha sido o ponto máximo da histeria midiática e "Doom" e Marylin Manson se tornaram alvos perfeitos para quem buscava explicações simples prontas para consumo. Além da controvérsia na época - a sede da id chegou a receber segurança policial - o tema foi revisitado pelo improvável "Super Columbine Massacre RPG!" de 2005, uma paródia do tratamento de "shownalismo" que a mídia tradicional deu ao episódio, demonizando jogos e músicas.

O game ficou disponível para download por alguns anos até ser "descoberto" pela imprensa tradicional, gerando indignação entre sobreviventes, familiares de vítimas e na opinião pública em geral. Independentemente de sua sensibilidade concordar com o tom do título, ele tem mérito como experimento de como os videogames podem servir para tratar de temas controversos assim como filmes e livros. Após protestos, o jogo foi retirado da Slamdance Film Festival's Guerrilla Gamemaker Competition à qual concorria em 2007, mas diversos desenvolvedores foram em defesa do título. "O jogo não tem compaixão e eu achei a declaração artística pouco interessante", disse na ocasião, o desenvolvedor de "Braid" Jonathan Blow. "Mas apesar disso, ele tem um valor redentor. Ele provoca pensamentos importantes, e testa as fronteiras sobre o que os videogames são capazes".

Não tenho a presunção de entender as motivações por trás de um massacre como o de Realengo, mas é importante que a discussão promovida pela imprensa tenha mais responsabilidade e menos sensacionalismo. Todos queremos compreender o que leva a um ato de fúria como esse - tão assustador por poder ocorrer na escola ou trabalho de qualquer um -, mas de nada adianta nos agarrarmos a uma resposta simples para um evento complexo. Talvez neste momento seja mais importante pensarmos em como a nossa sociedade contribuiu na criação do monstro, do que no monstro em si.

A coluna opinativa Além do Jogo trata do impacto dos games no chamado mundo real.

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