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Com história e estilo incomparáveis, "Persona 5" é candidato a Jogo do Ano

Victor Ferreira

Do Gamehall, em São Paulo

05/05/2017 12h26

Novo RPG japonês é um dos melhores exclusivos das plataformas PlayStation em 2017 - e provavelmente de todos os tempos

É justo dizer que, nas últimas semanas, “Persona 5” consumiu quase todo meu tempo livre.

Também é justo dizer que, após mais de 117 horas e um final envolvente e satisfatório, minha única vontade era a de continuar jogando, explorando Tóquio e conhecendo mais dos companheiros e habitantes que encontrei durante esta jornada.

Após quase 10 anos desde a estreia de “Persona 4” no PlayStation 2 (!) e um ganho significativo de popularidade no Ocidente, o novo jogo tinha grandes expectativas para superar, e a equipe de desenvolvimento da Atlus certamente não desapontou, com quase todos os elementos do jogo sendo tão bons ou melhores do que seu predecessor.

Roubando corações

Ao contrário dos últimos jogos da série, que se passavam em cidades fictícias, “Persona 5” acontece em Tóquio, recriando regiões famosas da metrópole como Shibuya e Akihabara.

Nota de Persona 5 - Arte/UOL - Arte/UOL
Game foi avaliado no PlayStation 4
Imagem: Arte/UOL

Como em “Persona 3” e “4”, o protagonista é um estudante que é transferido para uma escola local. Ao contrário dos games anteriores, porém, a reputação de seu personagem o precede, sendo conhecido por todos como um delinquente juvenil após ter atacado alguém.

(E por “atacado” entenda-se “salvou uma mulher de ser assediada por alguém com conexões importantes”.)

Com sua reputação destruída, o jovem vai para a cidade grande, onde eventualmente descobre o Metaverso, uma espécie de dimensão paralela criada pelos desejos subconscientes da população.

Persona 5 - Phantom Thieves - Reprodução - Reprodução
Gente bonita e elegante
Imagem: Reprodução

Por meio deste mundo, o protagonista e seus amigos - cada um sendo um “pária” à sua própria maneira por meio de algum sofrimento ou opressão de figuras de poder - viram os chamados “Phantom Thieves of the Heart”, um grupo de ladrões capaz fazer figuras poderosas admitirem seus crimes e terem uma “mudança de coração”.

Para isso, eles devem se infiltrar nos “Palácios” de cada um de seus alvos e roubar seu tesouro interno mais precioso.

Embora por fora a narrativa seja um tanto exotérica, e às vezes forçarem a mão com alguns personagens, a equipe da Atlus foi capaz de retratar diversos aspectos e injustiças sociais dentro do jogo, de extorsão e abuso sexual e psicológico até corrupção, culto à celebridades e apatia geral do público.

Tudo isso poderia ser retratado de forma extremamente pessimista e sombria (e muitas vezes realmente é), mas um dos pontos fortes da narrativa do game é seu tom agressivo e revolucionário, com os Phantom Thieves constantemente rindo e debochando dos representantes das instituições que tem arruinado suas vidas até agora, mostrando uma juventude insatisfeita com os erros e descaso com o mundo demonstrado pela geração anterior.

… É possível traçar paralelos claros entre a história do jogo e o que está acontecendo agora em vários lugares do mundo (incluindo o Brasil). Este é meu ponto.

Infelizmente, a história e temas de “Persona 5” só podem ser verdadeiramente apreciadas por quem tiver um bom entendimento de inglês (ou japonês!), já que não houve trabalho de tradução e localização para o português.

Persona 5 - Reprodução - Reprodução
Em "Persona 5", também é preciso viver uma vida honesta de estudante
Imagem: Reprodução

Tome seu tempo

Assim como seus predecessores, “Persona 5” é um jogo extremamente longo (como é de se esperar de um RPG japonês), mas consegue distribuir bem as diferentes atividades oferecidas ao jogador.

A narrativa principal do jogo é focada nas infiltrações dos Palácios de cada alvo dos Phantom Thieves, onde acontecem os combates principais, que à primeira vista lembram o jogo anterior: lutas por turnos, em que o objetivo do jogador é essencialmente “desvendar” a fraqueza dos monstros adversários, usando poderes, companheiros e Personas diferentes para descobrir suas vulnerabilidades e resistências.

Para conseguir habilidades e poderes melhores, o jogador deve adquirir novas Personas, principalmente por de fusões, em que duas (ou mais) são sacrificadas para criar uma nova criatura, herdando algumas de suas habilidades no processo.

Há, porém, várias pequenas mudanças de qualidade de vida durante as batalhas, incluindo a possibilidade de negociar itens, dinheiro e até Personas novas com os monstros derrotados, mecânica que não era vista desde “Persona 2”.

O combate e as infiltrações, porém, não são tudo o que o jogo tem a oferecer. Por também ser um estudante colegial, o protagonista deve viver uma vida comum, indo para a escola, estudando para provas, saindo com os amigos, etc.

Em jogos comuns isso poderia ser visto como a parte tediosa do jogo, mas a série sempre conseguiu transformar este em um de seus elementos mais engajantes, e “Persona 5” não é exceção.

Cada companheiro de equipe ou personagem secundário com quem você forma um elo - chamados aqui de Confidants - traz uma história própria que, em geral, tem excelentes arcos, desde as buscas artísticas de Yusuke até a redenção política de “No-Good Tora” Yoshida.

Até mesmo ações mais mundanas, como ir ao cinema com um de seus amigos, dá uma nova perspectiva aos personagens... e oportunidade para a Atlus fazer paródias terríveis e geniais ao mesmo tempo.

É claro, alguns destes arcos são melhores do que outros (são 21 personagens, cada um representando um carta do Tarot, afinal de contas), e há momentos…

Persona 5 - Kawakami - Reprodução - Reprodução
Uh... É melhor em contexto?
Imagem: Reprodução

... problemáticos em alguns deles, mas ainda assim todos tem seus pontos altos.

E mesmo assim, não é como se estas interações não causem impacto no resto do jogo: aumentar o nível dos elos com seus Confidants podem trazer grandes benefícios ao jogador, desde habilidades extras para seus companheiros até descontos em lojas, melhores opções de negociação com os monstros, e até táticas extras durante as lutas.

Persona 5 - Olhos - Reprodução - Reprodução
A coisa ficou séria
Imagem: Reprodução

Roubando com estilo

É impossível não falar de “Persona 5” sem ao menos mencionar a incrível direção de arte e técnica dentro do jogo.

Tudo no jogo, desde sua interface, transições e ângulos de câmera foram pensados para ser o mais cool possível, e funciona inacreditavelmente bem, trazendo mais personalidade em uma simples mudança de menu do que outros games inteiros.

Talvez a única crítica seja a de que este estilo possa ser invasivo demais, cobrindo partes importantes da tela que podem levar o jogador ao cometer um erro tentando emboscar um inimigo.

Destaque especial também para a trilha sonora de Shoji Meguro, que traz composições geniais e que não desgrudam da sua cabeça, como "Last Surprise", "Life will Change", "Butterfly Kiss" e "The Whims of Fate", para falar só de algumas.

A meu ver, por enquanto, a única trilha comparável em 2017 é a de “NieR Automata”

Persona 5 - Show's Over - Reprodução - Reprodução
Imagem: Reprodução

O show acabou

Sim, “Persona 5” tem seus defeitos: os palácios podem ser relativamente curtos, alguns têm pontos de segurança mal colocados, e alguns trechos dos calabouços podem ser tediosos, como os labirintos do sétimo dungeon.

E apesar de várias melhorias e correções ao gameplay, se você tivesse que me forçar a escolher ainda colocaria “Persona 4” à frente por seu ar mais pitoresco - e por um pouco de nostalgia, já que ele foi meu primeiro jogo da série.

Ainda assim, “Persona 5” é um jogo brilhante, que faz mais de 100 horas passarem voando e que oferece uma ótima história, com personagens envolventes e gameplay simples, mas com bastante profundidade.

A não ser que você deteste RPGs japoneses e suas convenções, não há motivos para não conferir o que um dos fortes concorrentes a melhor jogo do ano, seja no PS4 (e PS3) ou em qualquer outra plataforma.