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Mulheres superam machismo e fazem sucesso falando de games no Xbox

Pablo Raphael

Do UOL, em São Paulo

10/04/2015 17h18

Já faz tempo que videogame não é coisa só para meninos: As mulheres representam hoje 48% dos jogadores, segundo dados da norte-americana ESA (Entertainment Software Association). A presença das meninas é notável quando se observa o fenômeno youtuber - lá, vemos garotas que jogam videogame e falam sobre isso na internet, conquistando um espaço significativo, ainda que encarando comentários machistas de parte do público.

A dupla Thais Matsufugi e Mariana Ayres dá um passo além nessa história: elas apresentam o programa Inside Xbox, transmitido não só no YouTube, mas diretamente no Xbox Live, junto com o jornalista Nelson Alves Júnior.

Quem assiste, muitas vezes imagina que Thais e Mariana são apenas apresentadoras, sem uma ligação maior com games. "Quando eu me encontro pessoalmente com alguém que assiste o programa eu tenho que ficar me justificando, dizendo que eu realmente jogo e que gosto de games", conta Thais ao UOL Jogos. "Normalmente essas pessoas ficam surpresas".

Thais tem 25 anos e se formou em Design de Games em 2012. "A minha intenção, na verdade, quando decidi fazer este curso, era a de trabalhar na produção de games e não falar sobre eles". Após a faculdade, Thais trabalhou em agências de publicidade por um bom tempo antes de voltar para a sala de aula, dessa vez como professora. "Surgiram propostas para que eu lecionasse matérias ligadas à arte em cursos técnicos  e inclusive na universidade em que eu havia me formado".

Foi nessa época que surgiu a oportunidade de participar do Inside Xbox Brasil. "Um colega, professor de audiovisual, estava envolvido num projeto de vídeos sobre games e queriam uma garota para apresentar, que falasse em público e gostasse de jogar. Como sempre fui empolgada para participar de projetos, falei que sim na mesma hora", relembra. "Só depois de quase 1 mês eu fui informada de que o tal projeto tratava-se do Inside Xbox. Eu fiquei sem reação na hora".

Hoje, Thais dedica todo seu tempo ao Inside Xbox, mas até bem pouco tempo atrás, se dividia entre o trabalho como apresentadora e as salas de aula. "Estava dando aulas para crianças de abrigo, porém a agenda do programa ficou apertada e fez com que eu parasse".

No lugar certo, na hora certa

Já Mariana, de 24 anos, trabalhava na parte administrativa do grupo NZN. "Eu fazia jornalismo, gostava de jogos e tecnologia e poderia, mais tarde, trabalhar na parte de redação", conta a curitibana, recém chegada em São Paulo.

"Num belo dia me chamaram pra cobrir um funcionário que havia faltado e apresentei meu primeiro gameplay. A chefia gostou e me chamou pra fazer parte da equipe de vídeo". Daí em diante, Mariana fez carreira apresentando vídeos sobre games, jogando os últimos lançamentos e acabou chamando a atenção da Microsoft.

  • Reprodução

    Thais e Mariana apresentam o Inside Xbox junto com Nelson Alves Jr. (centro)

Superando o machismo

Por mais que entendam de games e tenham a aceitação da indústria, tanto Thais quanto Mariana admitem que nem sempre foi fácil lidar com o público.

"No começo tudo foi mais difícil, porque ninguém me conhecia e o preconceito com garotas gamers é ridiculamente grande", diz Mariana. "Apesar de hoje em dia a divisão ser quase de 50/50 quanto à mulheres e homens que jogam videogame, o machismo infelizmente ainda reina nesse meio".

NO YOUTUBE

  • Divulgação

    A estudante de Direito Mariana Ferreira, a Satty, criou o canal PenseGeek para falar de várias coisas que gosta, entre elas games. "Jogo desde criança, é influência do meu pai". Satty reconhece que o preconceito com mulheres que jogam é grande na internet. "O problema é que muito homem não aceita que algo que há um tempo atrás era super 'clube do bolinha' agora está sendo 'invadido' por mulheres e por isso eles ficam com raiva, ficam tentando desmerecer meninas a todo custo. O pior é que muitas vezes esses mesmos meninos ficam pedindo para encontrar namoradas gamers, mas não percebem que com essas atitudes babacas eles afastam as meninas deste meio".

"A maioria dos comentários eram relacionados à minha aparência", conta Mariana. "Falavam sobre como eu teria feito pra conseguir esse tipo de espaço na internet. Isso me deixava muito triste e também me inibia. Mas com o tempo eu aprendi a lidar com esse tipo de situação e até me fortaleceu como mulher".

"O preconceito existe não apenas em relação ao sexo da pessoa, mas também quanto à idade e até opção sexual. Aí o que acontece são pessoas mascarando essas características com nicks e avatares masculinos, deixando de falar (e às vezes até de participar) em partidas online e também deixando de trabalhar no meio", aponta.

"São tantos absurdos que eu só posso me sentir sortuda e emponderada a ponto de seguir em frente nessa carreira pra tentar mudar um pouco esse cenário. Afinal, quantas meninas deixam de fazer vídeos na internet por se deixar levar por comentários machistas?".

"Sempre converso bastante com o pessoal no Facebook, Instagram e principalmente na Dash do Xbox", diz Thais, que gosta de interagir com os fãs e ouvir as sugestões para o programa. Já no YouTube, a situação é outra: "eu sinceramente evito olhar comentários. Normalmente o preconceito em relação às garotas no mundo dos games é absurdo e eu já sofri bastante com comentários maldosos por lá".

Infelizmente, o preconceito não fica restrito às redes sociais. Na faculdade, Thais trabalhava em uma loja de games, a única garota entre 5 vendedores. A loja podia estar lotada e todos os vendedores ocupados,mas nenhum cliente me procurava para saber dos jogos. Certa vez, um dos clientes chegou a me destratar dizendo que eu era mulher e que estava no lugar errado porque dei minha opinião sobre um console e ele não concordou. Terminou com o gerente da loja intervindo e retirando o indivíduo da loja".

  • Reprodução

    "Hoje em dia eu acho graça de quem tem esse tipo de pensamento pequeno e tento explicar como o mundo é maior e melhor do que o preconceito das pessoas", diz Mariana sobre o preconceito com as meninas que jogam videogame.

Virando o jogo

Thais e Mariana conquistaram um espaço importante para as jogadoras, apresentando um programa de games diretamente no Xbox Live, a rede online dos consoles Xbox One e Xbox 360. Mas não são as únicas. Desde veteranas como Flávia Gasi até youtubers como Malena, Dinossaura, Satty, entre outras, há meninas jogando e falando de games com a mesma propriedade que os garotos.

"Temos garotas de peso no ramo! Posso citar nomes como a Monique Alves do REDatabase, a Fernanda Pineda que agora está na Ubisoft, a IGN esta chegando com uma apresentadora para o Daily Fix", comenta, animada, Thais.

"Hoje em dia é super normal encontrar garotinhas com portáteis na mão passeando com a família pelo shopping ou irmãs mais novas enchendo o saco do irmão para passar logo o controle", observa Thais. "Além disso temos os pais! É só pensar, todos esses gamers de hoje um dia terão filhos e vão passar esse gosto por games à diante,mesmo que os descendentes sejam garotas".

"Essas futuras gamers serão os troféuzinhos dos pais que vão se encontrar com os amigos daqui a alguns anos e dizer com o peito estufado: 'minha filha ama games!' ou seja... as mulheres estão vindo com tudo!"