"Mafia III" traz ótima narrativa, mas sofre com missões repetitivas
Quando tive a chance de jogar “Mafia III” pela primeira vez, em abril, notei que era um game com potencial, mergulhado em um jogo de ação em mundo aberto genérico.
Seis meses e quase 40 horas de jogo depois, e a impressão final é... essencialmente a mesma. “Mafia III” é excelente em vários aspectos, desde a história e estética de uma cidade do Sul dos EUA nos anos 1960, até as mecânicas de combate e a estrutura das missões principais do jogo.
Por outro lado, para chegar na maior parte deste conteúdo de qualidade o jogador é forçado a repetir a mesma estrutura básica de missões por horas a fio, com o bem ocasional momento de variedade.
Isso sem falar nos vários problemas técnicos do game, que variam entre o divertidamente bizarro até o cansativo e irritante
É uma experiência ao mesmo tempo brilhante e frustrante, difícil de recomendar mas ainda assim memorável – isto é, se você conseguir superar seus diversos problemas.
Tempo de vingança
Ao contrário de seus predecessores, “Mafia III” não coloca o jogo no controle de um gângster italiano, e sim de Lincoln Clay, um criminoso afro-americano e veterano da Guerra do Vietnã que vê sua família adotiva ser assassinada por Sal Marcano, mafioso que comanda a cidade de New Bordeaux – inspirada por Nova Orleans.
A narrativa e estética de New Bordeaux são de longe a parte mais forte de “Mafia III”, que utiliza uma linguagem de documentário para recriar a trajetória criminosa de Lincoln, baseando evento do jogo em entrevistas com versões “contemporâneas” de personagens da história.
A Hangar 13 aproveitou bem as licenças musicais adquiridas para o jogo, dando o tom e impacto de cenas importantes com canções de bandas como Rolling Stones, Creedence Clearwater Revival, Sam & Dave, entre outros.
New Bordeaux em si também é um atrativo à parte, não necessariamente por seu tamanho ou variedade de locais, mas principalmente pelo que representa neste ponto da história americana. Assim como Nova Orleans, ela é uma cidade localizada no Sul dos EUA, e assim como outros lugares desta região em 1968, era palco de um embate entre a população branca e membros do movimento dos Direitos Civis.
O racismo é uma parte íntegra de “Mafia III”, não só na forma em que personagens da história reagem a Lincoln e alguns de seus associados, mas também implementado em diversas mecânicas do jogo. Certas lojas e estabelecimentos tem políticas claras de segregação racial, e seus donos irão constantemente seguir a assediar o jogador até que ele saia – ou, se você for como eu, até serem nocauteados com um cruzado de direita bem colocado.
O tempo de reação da polícia também depende de cada parte da cidade: em bairros com população predominantemente negra, as viaturas demoram a chegar; já regiões mais afluentes e com maior parcela de brancos tem uma resposta quase imediata.
(Embora, curiosamente, o jogador não precisa mais respeitar as leis de trânsito como os dois games anteriores).
Claro, isso não quer dizer que o jogo seja um estudo das políticas raciais dos EUA em meados do século XX, mas ajuda a dar um tom para o resto do jogo, incluindo algumas das missões mais elaboradas, em que é preciso se infiltrar em um evento especial para a elite branca e drogá-los com LSD.
Ciclo sem fim
Para destruir o império de Sal Marcano, Lincoln deve tomar as diferentes regiões de New Bordeaux, com ajuda de três subchefes: Vito Scaletta, protagonista de “Mafia II”; Cassandra, líder da gangue haitina; e Thomas Burke, que comanda os criminosos irlandeses da cidade.
Para tomar estes territórios, Lincoln deve primeiro adquirir os esquemas criminosos deles, para depois matar o líder da área e oferecê-la a alguma de seus tenentes.
E é aí, infelizmente, que mora o maior problema de “Mafia III”: para tomar estes esquemas, o jogador deve repetir quase sempre as mesmas missões de novo e de novo.
E de novo.
Enquanto jogos semelhantes como “Saints Row” e “Sleeping Dogs” conseguem dar mais longevidade ao variar os tipos de missões, “Mafia III” sofre com uma constante monotonia. Independente da “mercadoria” do esquema – prostituição, jogos de azar, drogas, etc. –, o objetivo quase sempre acaba sendo uma versão de “vá até este ponto e mate estes caras”. Ocasionalmente também tem o “vá para este ponto, mate estes caras, e interrogue o que sobrar”.
As missões principais para assassinar o líder de cada região fogem um pouco deste padrão, e acabam sendo algumas das melhores partes da campanha, incluindo a já mencionada infiltração no evento dos ricaços, além de um tiroteio em um hotel de luxo e uma luta de boxe ilegal.
Para chegar a elas, porém, o jogador deve repetir os mesmos objetivos até todos os esquemas estarem sob seu comando, e isso leva tempo e pode torrar a paciência de qualquer um.
O combate ajuda um pouco a ignorar esta rotina, com uma sensação satisfatória de peso e impacto ao disparar as diferentes armas, e animações bem trabalhadas de inimigos ao cair em diferentes locais e superfícies – o que acaba compensando a sua inteligência artificial fraca.
Além disso, o novo game chega a remover certos aspectos típicos de mundo aberto presentes em “Mafia II”. Não é possível, por exemplo, customizar Lincoln com novas roupas ou visuais, ao contrário de Vito.
De certa forma, “Mafia III” chega a ter o problema oposto de seu predecessor: enquanto “Mafia II” não parecia querer se passar em um mundo aberto, o novo jogo aceita esta liberdade, mas não parece saber muito o que fazer com ela.
Problemas técnicos
Além da estrutura repetitiva, “Mafia III” também não parece ser um jogo que recebeu polimento suficiente antes de seu lançamento,a se julgar por seus diversos bugs e problemas de otimização.
Muitos destes bugs acabam sendo inofensivos, como o da foto acima. Nada de muito incomum em jogos de mundo aberto, mas bizarro o suficiente para ser notado.
Ocasionalmente, porém, alguns problemas afetam as missões de forma negativa, como personagens sendo trancados para o lado de fora de prédios e impedindo o progresso da missão.
Dando foco momentâneo à versão de PC, também é possível ver que seu processo de otimização foi pouco priorizado. Originalmente travado com em 30fps, o game foi atualizado para ter diferentes opções de taxa de quadros, mas meu computador – que consegue rodar tranquilamente “The Witcher 3” e “GTA V” em alta qualidade a 60 fps – raramente ultrapassava a marca de 45fps.
Isso até não seria um grande problema se os efeitos de iluminação e antiserrilhamento não piorassem o visual do jogo.
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