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Antes de "Resident Evil", "Call of Cthulhu" levou terror para mesa de jogo

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Pablo Raphael

Do UOL, em São Paulo

19/11/2017 04h00

Imagine um jogo com mansões vitorianas tomadas por mortos-vivos capazes de fazer picadinho do jogador, chefões monstruosos tão bizarros que o ser humano não é capaz de encará-los sem ter a mente despedaçada. Um game onde você controla um mero investigador, um agente da lei ou um jornalista, pessoas normais, pegas desprevenidas nos planos de criaturas sobrenaturais contra as quais suas armas não tem nenhum efeito.

Parece o típico game de terror que o seu youtuber favorito joga aos berros? Talvez um "Silent Hill" ou "Resident Evil" dos bons? Todos esses jogos têm semelhanças com "Call of Cthulhu", mas o RPG de mesa publicado pela Chaosium em 1981 foi o primeiro a explorar os horrores dos contos do escritor H. P. Lovecraft. Diferente do que rolava em "Dungeons & Dragons" e outros jogos de interpretação da época, em "CoC" os jogadores não tinham grandes poderes, armas mágicas ou qualquer noção do que estavam enfrentando.

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Ao colocar os jogadores no papel de reles mortais lidando com horrores de outro mundo, "CoC" abriu caminho para o horror psicológico e de sobrevivência no mundo dos jogos, inspirando game designers a brincarem com as possibilidades do terror.

Resident Evil VII - Divulgação - Divulgação
A influência de "CoC" na série "Resident Evil" vai desde a clássica mansão assombrada até os monstruosos Mofados, seres bizarros e extremamente resistentes aos tiros, para o azar de Ethan.
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Contos Lovecraftianos

A ambientação original de "Call of Cthulhu" são os anos 1920, a época em que viveu o escritor H. P. Lovecraft e na qual ele situou as assustadoras histórias do "Mito de Cthulhu", como é chamado o conjunto de contos envolvendo cultos sinistros e criaturas muito mais antigas que a raça humana, que vivem adormecidas nas profundezas do oceano e são verdadeiros deuses do mal. "Cthulhu" é um desses antigos monstros-deuses, cujo despertar pode representar o fim da linha para a humanidade, ou coisa pior.

Esse cenário pode parecer menos inspirador do que um reino de fantasia medieval com dragões e hobbits ou a luta entre um poderoso império e uma aliança rebelde em uma galáxia muito distante, mas para histórias e aventuras de terror, funciona muito bem: é fácil para o jogador se identificar com os tipos de personagens, como detetives particulares, cientistas, exploradores ou jornalistas enxeridos. Existe uma falsa segurança graças à Ciência e ao uso de armas de fogo (até que o sobrenatural e o inexplicável entram em ação, demolindo a sanidade dos personagens). E um agitado pano de fundo geopolítico, tanto nos EUA quanto na Europa, permitem a criação de aventuras bastante agitadas.

Ao contrário de "D&D", "Call of Cthulhu" deixa de lado os dados de 20 faces e usa dados de porcentagem para calcular os resultados das ações dos jogadores. Mas, na prática, é um dos primeiros jogos que carregava mais na interpretação do que nas mecânicas de jogo - coisa que se tornaria padrão nos RPGs de horror, como "Vampiro: A Máscara" ou nos mais pesados "Kult" e "Wraith: The Oblivion", por exemplo.

Edições posteriores de "Call of Cthulhu" trouxeram cenários alternativos para as campanhas, desde aventuras em períodos históricos mais antigos, como o Império Romano e a Era Vitoriana até os dias atuais - dependendo da intenção dos jogadores, uma mesa de "CoC" pode se parecer com uma versão sombria de uma história de Sherlock Holmes ou com a temporada mais recente de "Stranger Things" - mas com um toque mais sombrio e insano.

Call of Cthulhu - Divulgação - Divulgação
A sétima edição de "O Chamado de Cthulhu" chegará ao Brasil pela New Order
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De 1981 para cá, "Call of Cthulhu" ganhou sete edições principais e acumulou prêmios de game design. Além disso, "CoC" também recebeu módulos com cenários alternativos e jogos de tabuleiro, de miniaturas e um card game.

A sétima edição do jogo chegará ao Brasil pela editora New Order, a mesma que trouxe "Shadowrun" e "A Lenda dos Cinco Anéis", entre outros jogos. O lançamento será feito via financiamento coletivo, com início previsto para o final do mês. Além do módulo básico, a editora planeja dar suporte ao jogo com aventuras em pdf, inclusive algumas feitas por autores brasileiros.

Não é a primeira vez que o RPG de terror é lançado por aqui: uma edição anterior do jogo foi publicada no país pela Terra Incognita e alguns anos atrás, a editora Retropunk lançou no Brasil o jogo "Rastro de Cthullu".

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Cthulhu e os videogames

O horror psicológico de "Call of Cthulhu" inspirou diretamente a série "Alone in the Dark", considerada a primeira franquia de "survival horror". Os jogos da série eram baseados nos mesmos contos de Lovecraft que o RPG da Chaosiun e foram forte influência na criação de "Resident Evil" e "Silent Hill", entre outros games de terror.

Curiosamente, nos últimos anos a figura de Cthulhu ficou bastante popular e rendeu jogos fofinhos como "Cthulhu Virtual Pet", onde o jogador precisa cuidar de uma versão bonitinha do Antigo, no melhor estilo "Tamagotchi": o monstrinho cheio de tentáculos precisa de sono, atenção e comida - e você pode fazer sacrifícios para o pequeno Cthulhu na hora das refeições.

Cthulhu Virtual Pet - Reprodução - Reprodução
Seu Cthulhu de estimação começa o jogo pequeno, apenas sonhando em aterrorizar humanos. Mas ele pode crescer...
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Atualmente, a produtora Cyanide está desenvolvendo um game que combina RPG e "survival horror", com a licença oficial e o título "Call of Cthulhu". No jogo, você vai acompanhar o detetive particular Edward Pierce em suas investigações sobre a morte de uma família inteira numa ilha nas proximidades de Boston, nos EUA, e o iminente despertar do grande Cthulhu.

O jogo, que será publicado pela Focus Home Entertainment, é descrito como uma aventura em um mundo semi-aberto e, segundo a publisher, é mais próximo do RPG de mesa do que dos contos de H. P. Lovecraft. Originalmente, "Call of Cthulhu" chegaria ao PC, PlayStation 4 e Xbox One no final do ano, mas acabou adiado para 2018, sem uma janela mais precisa para o lançamento.

Call of Cthulhu videogame - Divulgação - Divulgação
Nas mãos da Cyanide (a mesma do novo game de "Werewolf"), "Call of Cthulhu" promete ser um RPG de mundo "meio aberto" bem próximo ao estilo do jogo original.
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